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Publicado em 29/04/13 por Equipe NEXUCs na categoria Publicações | (0) Comentários

Capacitação e planejamento de conselhos consultivos: estruturando a participação responsável na gestão das unidades de conservação

Artigo de autoria de Gisela Hermann e Cleani Paraiso Marques apresentado no VII CBUC

Resumo:

Mais do que uma exigência legal, os conselhos de unidades de conservação (UC) tem um papel fundamental para o bom funcionamento do sistema, uma vez que as UCs frequentemente deparam com graves conflitos de interesses, necessitando de canais legítimos de interlocução. Entretanto, quando o conselho existe, é comum o seu papel e atribuições não serem devidamente entendidos e assimilados pelos órgãos gestores responsáveis pelas UCs e pelos próprios conselheiros. Essa lacuna ajuda a ampliar os conflitos, apontando para a necessidade de investimento na capacitação dos envolvidos. A metodologia de capacitação de gestores e membros de conselhos de UCs apresentada no presente artigo surgiu de uma experiência prática de campo. Foi desenvolvida a partir de uma demanda identificada pelo projeto “Construção participativa do Corredor Ecológico da Mantiqueira”, que tinha entre seus objetivos o fortalecimento das seis unidades de conservação presentes no território do corredor, através da criação e capacitação de seus conselhos consultivos. Apesar de se tratar de um caso específico, a situação na Mantiqueira serve para ilustrar a realidade de outras regiões do país. A experiência adquirida com as oficinas de capacitação do projeto foi posteriormente aplicada em outros locais. Durante o período de 2007 a 2011 foram realizadas 23 oficinas de capacitação de conselhos de 37 UCs de Minas Gerais e do Espírito Santo, envolvendo cerca de 500 participantes. Apesar das diferentes UCs estarem inseridas em diferentes contextos, de uma maneira geral, todos os conselhos apresentavam as mesmas demandas de investimento na disseminação de informações, principalmente para ajudar a dar uma maior transparência à gestão da UC, e na organização do trabalho do conselho, visando aumentar a produtividade e diminuir a frustração causada pela participação sem resultados concretos. A oficina de capacitação de gestores e membros de conselho de unidades de conservação tem um caráter multidisciplinar, envolvendo palestras dialogadas, técnicas vivenciais e trabalhos em grupo. O objetivo geral é auxiliar no desenvolvimento de competências conceituais, procedimentais e de atitudes nos membros dos conselhos consultivos, voltadas para o papel a ser desempenhado nestes grupos de trabalho. Com três dias de duração, a oficina é estruturada em três dimensões: i) conceitual: apresentação e debate sobre informações mínimas necessárias ao bom desempenho do conselheiro; ii) comportamental: aborda temas relacionados com técnicas para o trabalho em equipe e organização do trabalho para a solução de problemas, com foco em resultados; iii) planejamento participativo: aplicação de ferramenta de planejamento e construção coletiva do Plano de Trabalho do Conselho. As três dimensões são trabalhadas ao longo da oficina de maneira intercalada e integrada, buscam criar situações onde os participantes da oficina possam vivenciar os temas apresentados. Na etapa final da oficina, os participantes são convidados a elaborarem o Plano de Trabalho do Conselho da UC, utilizando da experiência adquirida com os debates e as técnicas vivenciais. Mais do que um treinamento no uso de uma ferramenta gerencial simplificada, adequada ao trabalho em equipe, a elaboração do Plano de Trabalho do Conselho visa contribuir para a internalização de uma cultura de planejamento participativo, com foco em objetivos bem delineados para solução de problemas, além de produzir um efeito de organização do trabalho distribuindo a responsabilidade das ações do conselho entre seus membros. A experiência de atuar num processo de planejamento participativo numa situação de capacitação onde o moderador desempenha também o papel de educador, promove uma oportunidade para os participantes dialogarem de forma produtiva sobre os diferentes interesses e problemas relacionados com a UC e sobre as pessoas que vivem na região, além de propiciar o desenvolvimento das competências interpessoais muito exigidas num processo participativo.

Introdução:

A Lei Federal 9. 985 de 2.000, que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), trouxe mudanças significativas no processo de criação e gestão de unidades de conservação, assegurando uma participação mais efetiva da sociedade. Dentre as inovações destaca-se o disposto no Artigo 29, que trata da exigência do estabelecimento de conselhos consultivos de apoio à gestão das unidades de conservação de proteção integral, compostos por representantes dos diferentes setores da sociedade, regulamentado pelo Decreto 4.340 de 22 de agosto de 2002.

Mais do que uma exigência legal, os conselhos, consultivos ou deliberativos, tem um papel fundamental para o funcionamento do sistema, uma vez que as UCs muito frequentemente deparam com graves conflitos de interesses, necessitando de canais legítimos de interlocução. Como quase toda a área tem algum recurso que potencialmente poderia ser explorado, garantir a sua não exploração, ou a sua exploração parcial, envolve a busca de consensos, muitas vezes difíceis de serem alcançados (Herrmann, 2011). De uma maneira geral, grande parte das UCs, principalmente as de proteção integral, mais efetivas em termos de conservação da natureza, sofre algum tipo de pressão, causada em grande parte pela baixa aceitação das comunidades locais, que muitas vezes não identificam benefícios diretos oriundos de sua existência. Por outro lado, muitas vezes as instituições responsáveis pelas UCs não estão devidamente preparadas para dialogar com as comunidades locais e não buscam entender e aproveitar as diferentes visões e conhecimentos no planejamento e gestão da UC. Essa falta de diálogo, além de enfraquecer a gestão da UC, impede a união de esforços contra ameaças, como por exemplo, quando poderosas corporações fazem pressão para modificar a lei e permitir a exploração parcial ou total de uma unidade de conservação. Outra conseqüência relevante é que a UC deixa de cumprir seu papel de gerar consciência ambiental, uma vez que um conselho desinformado e desarticulado dificilmente conseguirá atuar como formador de opinião e multiplicador de conhecimentos e informações na comunidade local.

As dificuldades de entendimento dos diferentes papéis, e a dificuldade de comunicação entre os responsáveis pelas UCs e a sociedade, refletem-se na baixa implementação ou pouca produtividade dos conselhos. Apesar de previsto na legislação e amplamente aceito o princípio de que é necessário envolver a sociedade na gestão das UCs e no desenvolvimento regional, os exemplos de gestão participativa são relativamente raros no país. Em 2008, por exemplo, a maioria (67%) das UCs federais e estaduais não possuía conselho instalado (Palmieri & Veríssimo, 2009). Um dos motivos apontados para o não cumprimento da lei era a escassez de recursos financeiros e de pessoal técnico na grande maioria das UCs. Quando o conselho existe, é comum o seu papel e atribuições não serem devidamente entendidos e assimilados pelos órgãos gestores responsáveis pelas UCs e pelos próprios conselheiros. Essa lacuna ajuda a ampliar os conflitos, apontando para a necessidade de investimento na capacitação dos envolvidos, para que a sociedade possa efetivamente participar na prevenção de problemas e solução das questões socioambientais relacionados com a unidade de conservação e sua região (IBAMA, 2007).

A metodologia de capacitação de gestores e membros de conselhos de unidades de conservação apresentada no presente artigo surgiu de uma experiência prática de campo, tendo sido desenvolvida a partir de uma demanda identificada pelo projeto “Construção participativa do Corredor Ecológico da Mantiqueira”, desenvolvido pela Valor Natural, com financiamento do PDA do Ministério do Meio Ambiente, entre os anos de 2006 a 2009. Um dos objetivos do projeto era o fortalecimento das seis unidades de conservação presentes no território do corredor, através da criação e capacitação de seus conselhos consultivos. Apesar de se tratar de um caso específico, a situação na Mantiqueira serve para ilustrar a realidade de outras regiões do país. Os conflitos entre os órgãos responsáveis pelas UCs e os diferentes setores da sociedade, aliados à baixa capacidade de organização social e desconhecimento dos espaços formais de participação, não raramente, geram um cenário de pouca produtividade e frustração entre os envolvidos com as UCs.

Na Mantiqueira, o processo de criação das UCs, mobilizado por minorias, e seu histórico de gestão, praticamente inexistente em algumas UCs e centralizado em ações punitivas, contribuíram para uma grande desconfiança das pessoas em relação aos órgãos responsáveis pelas UCs. Soma-se a esse contexto, o fato dos conselhos recém criados naquela época constituírem no único espaço institucionalizado para a resolução de conflitos já existentes dentro das próprias comunidades. As constantes disputas dentro dos conselhos, e a falta de um objetivo comum a ser perseguido, além de serem contra produtivas, levavam à frustração e ao descrédito quanto ao papel do conselho na gestão das UCs.

O diagnóstico realizado para subsidiar o planejamento do projeto “Construção participativa do Corredor Ecológico da Mantiqueira”, além de identificar a necessidade de empoderamento e capacitação da população local para atuar na gestão ambiental, indicou a necessidade de se trabalhar as relações interpessoais dentro dos conselhos, visando facilitar a comunicação, qualificando as pessoas para a resolução de problemas e a construção de consensos, enfim, para a própria gestão do conselho. A experiência adquirida com as oficinas de capacitação do projeto foi posteriormente aplicada em 33 unidades de conservação em Minas Gerais e no Espírito Santo, ao longo dos anos de 2007 a 2011. Apesar das diferentes unidades de conservação estarem inseridas em diferentes contextos, de uma maneira geral, todos os conselhos apresentavam as mesmas demandas de investimento na disseminação de informações, principalmente para ajudar a dar uma maior transparência à gestão da UC, e na organização do trabalho do conselho, buscando aumentar a produtividade e diminuir a frustração causada pela participação sem resultados concretos. Foi surpreendente constatar que em praticamente todas as unidades de conservação o histórico de conflitos, ou as dificuldades de conversação, causavam desentendimentos e dispersão de energia emocional das pessoas, perdendo-se uma rara oportunidade de canalizar os esforços para o fortalecimento da gestão das UCs.

A metodologia criada para o projeto buscou reforçar a particular importância das lideranças, num papel não apenas educativo, mas também político, engajado na construção da gestão participativa das UCs. Acreditamos que tais agentes são os canais por onde a política ambiental pode ser planejada de forma a representar as diferentes realidades locais, inclusive em temas não diretamente relacionados com as UCs. Diferentes interessados possuem diferentes capacidades, sendo muitas vezes necessário construir capacidade local para atuar num processo que exige habilidades para o manejo e análise de informação, liderança, planejamento e na organização do trabalho. A oficina de capacitação, e a oportunidade de integração entre os diferentes atores que a mesma oferece, favorece a formação de capacidade técnica e institucional, fundamental para a gestão das unidades de conservação e para o desenvolvimento regional.

 

Metodos:

A oficina de capacitação de gestores e membros de conselho de unidades de conservação tem um caráter multidisciplinar, envolvendo palestras dialogadas, técnicas vivenciais e trabalhos em grupo. Com três dias de duração, a oficina é estruturada em três dimensões: i) conceitual: apresentação e debate sobre informações mínimas necessárias ao bom desempenho do conselheiro; ii) comportamental: aborda temas relacionados o trabalho em equipe e organização do trabalho para a solução de problemas, com foco em resultados; iii) planejamento participativo: aplicação de ferramenta de planejamento e construção coletiva do Plano de Trabalho do Conselho (Quadro 01). As três dimensões são trabalhadas ao longo da oficina de maneira intercalada e integrada, buscando criar situações onde os participantes da oficina possam vivenciar os temas apresentados. Partindo da premissa que a aprendizagem é fortalecida quando os participantes têm a oportunidade de executar uma tarefa relacionada com os temas tratados, na etapa final da oficina, os participantes são convidados a elaborarem o Plano de Trabalho do Conselho da UC.

O objetivo geral da capacitação é auxiliar no desenvolvimento de competências conceituais, procedimentais e de atitudes nos membros dos conselhos consultivos, voltadas para o papel a ser desempenhado nestes grupos de trabalho, com os seguintes objetivos específicos:

  • Repassar e discutir conceitos e informações técnicas básicas sobre a conservação da biodiversidade e planejamento ambiental, necessárias à atuação responsável como conselheiro de UC
  • Compreender as atribuições do conselho na gestão da UC
  • Identificar papéis do membro conselheiro e os desafios de ocupar esta posição
  • Compreender a diferença do escopo de atuação decisório e consultivo
  • Propiciar o desenvolvimento de competências básicas para um modelo de atuação consultivo ou decisório dependendo da categoria de manejo da UC
  • Compreender o conselho como uma equipe de trabalho que necessita de um modelo de organização para produzir resultados efetivos
  • Conhecer o ciclo de gestão – PDCA (do inglês: planejar, fazer, monitorar e agir corretivamente) como modelo facilitador para gestão do conselho (Deming, 1990)
  • Elaborar o Plano de Trabalho do Conselho.

Mobilização e preparação:

O processo de mobilização prévia à oficina envolve um levantamento junto ao conselho de temas de maior interesse, a serem abordados com maior ênfase durante a capacitação e também para fazer um alinhamento das demandas dos conselheiros em relação à capacitação. Esse levantamento é realizado através de entrevistas semi-estuturadas, que também procuram identificar o perfil dos conselheiros, a realidade local e os principais pontos de conflitos existentes dentro do conselho. Mais do que a elaboração de um diagnóstico, é nesse momento que os conselheiros começam a ser mobilizados para a capacitação e para a necessidade do planejamento das ações do conselho.

Apesar de envolver temas relativamente simples para o pessoal da área ambiental, a oficina de capacitação e planejamento das ações do conselho, envolve o debate e a discussão de situações, muitas vezes complexas, que envolvem o dia-a-dia dos conselheiros, da UC e das comunidades. Para facilitar o processo de planejamento e catalisar os debates é fundamental que os profissionais responsáveis pela oficina possuam grande capacidade de comunicação, conhecimento sobre o tema e experiência no manejo de grupos e em mediação de conflitos. A metodologia não foi desenvolvida para fazer um simples repasse de informação técnica e institucional. Foi delineada principalmente para favorecer o diálogo entre as pessoas, permitindo a identificação dos problemas e a busca de soluções, exigindo a facilitação por profissionais com experiência na construção de acordos e agendas negociadas e produtivas.

Uma vez que a oficina envolve exercícios vivenciais e trabalho em grupo bastante intenso, é necessária a existência de um local que favoreça a concentração e o conforto dos participantes, pois o desempenho do grupo é influenciado pelas condições do espaço disponível. A oficina é planejada para no máximo 40 participantes, pois um número maior de pessoas dificulta a dinâmica, a concentração e a participação equilibrada de todos.

Desenvolvimento da oficina:

No inicio da oficina os participantes são convidados a se apresentarem e a dizer qual o setor que representam. Esse procedimento visa, além da aproximação das instrutoras com os participantes, identificar como os mesmos entendem a representação setorial.

Depois dessa breve apresentação é realizada a primeira palestra dialogada sobre os aspectos gerais da biodiversidade, do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e da gestão participativa (vide detalhamento no Quadro 01). Nesse momento os participantes são introduzidos no universo das UCs e no tema principal a ser tratado ao longo da oficina. Além de buscar nivelar os conceitos, a palestra busca estimular os participantes a refletirem mais além dos problemas e da rotina do contexto local e a começarem a adotar uma visão mais ampla e sistêmica da conservação, buscando o fortalecimento da atuação política em prol da conservação.

Reflexões sobre o conselho da UC:

Para iniciar essa reflexão, após a primeira palestra dialogada os participantes são divididos em pequenos grupos e solicitados a responder as seguintes perguntas sobre o conselho:

  • Para que existe?
  • Quem são os clientes?
  • Qual o perfil desejável do membro? (que competências devem ter)
  • Quais as dificuldades em ocupar esta posição?

A partir das apresentações dos grupos, é iniciado um debate sobre o conselho, onde são destacadas questões como o conselho ser um espaço de influencia em mão dupla, onde a UC influencia a comunidade e a comunidade influencia a UC. Também são destacadas algumas habilidades essenciais ao perfil de um conselheiro, entre elas liderança e capacidade de influenciar pessoas. As motivações que levam alguém a aderir ao trabalho voluntário são tratadas, incluindo aspectos relacionados com o comprometimento, interesse, disponibilidade e proatividade.

Solução de problemas e organização do trabalho:

A necessidade de se estabelecer um modelo de organização do trabalho e de comportamentos que efetivamente conduzam a solução do problema é tratada com a utilização da dinâmica do Obelisco ZIN. Com esse exercício os participantes vivenciam uma situação simulada de solução de problema em grupo e começam a ser preparados para a construção coletiva do Plano de Trabalho do Conselho, que será levada a cabo ao final da oficina. Para isso, os participantes são estimulados a pensar no conselho como uma organização, que como qualquer outra, depende de uma boa gestão, necessitando de um modelo de organização do trabalho que leve aos resultados estabelecidos em seu plano de trabalho.

Cooperação e visão sistêmica:

A discussão sobre trabalho em equipe é facilitada pelo exercício dos Quadrados, especialmente dimensionado para tratar da cooperação. Nessa dinâmica, o grupo tem que construir quadrados com um número limitado de peças. O resultado final somente é alcançado se todos os participantes entenderam o objetivo final (foco do trabalho) e se comportarem a favor do resultado do grupo. Posturas egoístas e falta de uma visão sobre o todo inviabilizam o resultado do grupo.

Planejamento participativo do trabalho do Conselho:

O planejamento é conduzido de maneira que facilite a participação de todos os conselheiros. Para isso, deve ser dada uma atenção especial ao material produzido pelos grupos de trabalho e nas plenárias. A utilização de fichas coloridas de cartolina fixadas numa superfície que permita colá-las e descolá-las é uma boa alternativa para facilitar a visualização, possibilitando que todos os participantes acompanhem o que está sendo discutido. Lembrando que quem não visualiza não acompanha o raciocínio, conseqüentemente não participa. Assim, para facilitar a visualização e a organização das informações nas plenárias, cada idéia produzida pelos grupos de trabalho deve ser colocada em uma única ficha. Dessa forma, a idéia poderá ser validada, corrigida ou descartada à medida que o Plano de Trabalho for sendo elaborado.

No início do planejamento são formados grupos de trabalho (GT) com no máximo 5 participantes em cada um. A dinâmica do planejamento segue as seguintes etapas:

Levantamento e priorização dos problemas:

- Cada grupo faz o levantamento geral (“chuva de idéias”) dos principais problemas e aspectos conflituosos que afetam a UC e/ou seu conselho. Nesse momento, cada participante do GT deve ser estimulado a apresentar suas idéias e esclarecer suas posições. Cada problema deverá ser colocado em uma ficha, sendo que as mesmas deverão ficar disponíveis visualmente para todo o GT.

- Após a “chuva de idéias”, o GT deve fazer uma lista reduzida, tirando as repetições. Os participantes do GT devem buscar o consenso, pois somente os problemas considerados relevantes por todo o GT irão permanecer na listagem.

- Após a redução, deve ser feita uma reflexão sobre os problemas levantados. Estão corretos? Realmente refletem a realidade? Falta algo?

Apresentação em plenária:

- Cada GT apresenta os problemas levantados. Nesse momento os participantes são estimulados a expressarem a suas opiniões, pois somente os problemas considerados importantes por todos irão compor a listagem final.

- Após as apresentações é feita uma revisão. Os problemas repetidos são retirados.

- Após a revisão, os problemas listados são organizados em grupos de problemas de origem comum ou características semelhantes, tais como problemas relacionados com situação fundiária irregular; uso desordenado do entorno; gestão da UC; gestão do conselho; etc.

Definição de objetivos (o que se quer atingir):

- Os grupos de problemas com origem comum são distribuídos entre os GTs. Novos grupos devem ser criados, possibilitando a interação dos participantes com outras pessoas com novas visões. A rotatividade, nesse caso, enriquece as discussões.

- Cada GT deverá avaliar os problemas identificados em um determinado grupo de problemas e definir no máximo três objetivos a serem alcançados para minimizar ou solucionar os problemas identificados. Nessa etapa é importante ressaltar que o planejamento em construção tem que ser viável de ser executado pelo próprio conselho. Para isso, não devem ser estabelecidos muitos objetivos por grupos de problemas, pois resultaria num plano com um número excessivo de atividades.

- Os objetivos deverão ajudar a fortalecer o conselho e melhorar a gestão da UC e seu relacionamento com o entorno, dentro das competências e capacidade operacional do conselho. Deve ser enfatizado pelos facilitadores que o plano que está sendo construído é um planejamento do trabalho do conselho e não um planejamento da UC.

Detalhamento das atividades:

- Nessa etapa, os GTs definem as atividades a serem executadas para atingir os objetivos e ajudar a solucionar os problemas anteriormente identificados.

- É muito importante destacar que somente as atividades mais importantes e factíveis de serem realizadas pelo conselho deverão ser propostas para compor o Plano de Trabalho. O objetivo maior do planejamento é ajudar a organizar o trabalho do conselho, buscando aumentar o comprometimento dos conselheiros com a UC, a partir da geração de resultados concretos. Para não criar falsas expectativas, e frustrações com a não realização do que for acordado no planejamento, é importante garantir a sua viabilidade de execução. O Plano de Trabalho tem que refletir a capacidade instalada no conselho. Atividades importantes, mas fora do alcance do conselho, não devem entrar no planejamento, mas podem ser registradas para serem incorporadas futuramente, quando o conselho for capaz de executá-las.

Após a definição das atividades, os participantes do GT fazem o detalhamento estabelecendo os passos para execução de cada atividade, ou seja, as ações a serem realizadas. Para cada atividade e/ou ação deverão ser definidos os responsáveis e os prazos. Sempre que possível, os responsáveis devem ser nomeados, pois a indicação somente da instituição não garante o compromisso com a execução. No caso de se indicar uma pessoa não presente na oficina, um dos participantes deverá ficar responsável pelo contato, envolvimento e convite para pessoa assumir a responsabilidade pela atividade.

Para facilitar a organização e visualização podem ser estabelecidas cores distintas para os objetivos (p. ex. branca), atividades (p. ex rosa), ações (verde), responsáveis e prazo (azul).

Apresentação dos grupos de trabalho e discussão em plenária:

O trabalho de cada GT é apresentado e discutido na plenária. Após as apresentações é realizada a organização do plano, retirando as atividades repetidas e checando a viabilidade dos prazos e responsáveis. Nessa etapa é importante garantir que todos expressem os seus pontos de vista, para que os acordos sejam construídos e garantir o comprometimento com a execução. Os facilitadores da oficina devem maximizar a participação de todos e evitar que poucas pessoas monopolizem os debates.

Após a finalização do plano, são acordadas as propostas de encaminhamento do material produzido durante a oficina. Os participantes são estimulados a utilizarem o planejamento produzido como um referencial para as próximas reuniões do conselho, tanto para a construção das pautas, como para monitoramento das ações do conselho. Nesse momento o ciclo da gestão PDCA, apresentado nas palestras dialogadas, é resgatado para se enfatizar a necessidade de monitoramento do planejamento para corrigir as distorções e melhorar o desempenho do grupo.

Para fortalecer o sentimento de pertencimento dos participantes com o Plano de Trabalho que acabou de ser construído, e continuar com a mobilização iniciada, é importante que os mesmos recebam o documento final logo após a oficina de capacitação. Assim sendo, os facilitadores deverão editar o documento no prazo máximo de uma semana e encaminhar para distribuição entre os conselheiros. Visando aumentar a legitimidade do planejamento construído, e envolver os conselheiros que não estavam presentes na oficina, é importante definir o formato e os responsáveis pela apresentação do material produzido para o todo o conselho.

Avaliação da oficina:

Ao final da oficina deve ser feita uma avaliação da capacitação e do processo de planejamento a fim de corrigir as distorções e aperfeiçoar a aplicação da metodologia. Para garantir a manifestação das pessoas que se sentem constrangidas a uma avaliação oral, são distribuídas fichas com questões abordando tanto os aspectos conceituais e didáticos, como tópicos da organização e do material distribuído. Entretanto, para aprofundar na reflexão, os participantes são estimulados a fazer uma avaliação oral da experiência.

 

Resultados de discussão:

Durante o período de 2007 a 2011 participaram das oficinas de capacitação cerca de 500 pessoas, membros dos conselhos das seguintes UCs:

2011

  • Parque Estadual Serra da Araras e da Reserva de desenvolvimento sustentável Veredas do Acari
  • Área de Proteção Ambiental do Rio Pandeiros, APA Cochá Gibão e Refúgio de Vida Silvestre do Rio Pandeiros

2010

  • Sistema de Áreas Protegidas do Jaiba
  • APA Goiapaba-Açu
  • Reserva de Desenvolvimento Sustentável Concha D’Ostra
  • APA Pedra do Elefante
  • Parque Estadual de Itaúnas
  • Monumento Natural O Frade e a Freira
  • Parque Estadual da Pedra Azul
  • Parque Estadual Paulo César Vinha

2009

  • Parque Estadual Lapa Grande
  • Parque Estadual Serra do Brigadeiro
  • Parque Estadual Rio Doce
  • Parque Estadual Nova Baden
  • Parque Estadual do Itambé
  • Monumento Natural Peter Lund
  • Parque Estadual do Rio Preto
  • Parque Estadual do Itacolomi e Estação Ecológica do Tripiui
  • Floresta Estadual Uaimií e APA das Andorinhas
  • Parque Estadual do Sumidouro

2007

  • Parque Estadual do Ibitipoca
  • Parque Estadual Serra do Papagaio
  • Unidades de Conservação do Corredor Ecológico da Mantiqueira

As três dimensões para a qualificação

A metodologia da oficina, abordando de forma intercalada a parte conceitual, comportamental e de planejamento, cria o ambiente favorável à aprendizagem, evitando que a mesma se transforme num mero repasse de informações. Durante o planejamento, os participantes têm a oportunidade de utilizar da experiência adquirida com os debates e as técnicas vivenciais, colocando em prática as habilidades e os conhecimentos adquiridos. A experiência de atuar num processo de planejamento participativo, numa situação de capacitação onde o moderador desempenha também o papel de educador, promove uma oportunidade para os participantes dialogarem de forma produtiva sobre os diferentes interesses e problemas relacionados com a UC e sobre as pessoas que vivem na região. Além disso, propicia o desenvolvimento das competências interpessoais muito exigidas num processo participativo.

Mais do que um treinamento no uso de uma ferramenta gerencial simplificada, adequada ao trabalho em equipe, a elaboração do Plano de Trabalho do Conselho visa contribuir para a internalização de uma cultura de planejamento participativo, com foco em objetivos bem delineados para solução de problemas. É uma forma de organização do trabalho que permite distribuir a responsabilidade das ações do conselho entre seus membros.

“….Acredito que tenha sido uma experiência transformadora para todos os participantes…” (conselheiro de UC do Corredor Ecológico da Mantiqueira).

As dinâmicas em grupos fazem com que os participantes desenvolvam um trabalho coletivo com trocas de experiências e motivação” (conselheiro do Parque Estadual Serra das Araras e da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Veredas do Acari, MG).

“…..Pela primeira vez participei de uma capacitação que o foco é a pratica do grupo, já que muitas vezes os cursos se limitam a passar conteúdos teóricos…” (conselheiro do Parque Estadual Paulo César Vinha, ES).

O desenvolvimento de habilidades e competências

A grande maioria das capacitações envolveu conselhos recém criados ou no seu primeiro mandato. A falta de experiência com esse tipo de instância, tanto por parte dos conselheiros, como pelos gestores das UCs, foi observada logo no início da maioria das oficinas, quando os participantes se apresentam e informam sobre qual setor representam. A separação entre a representação institucional e setorial não é muito percebida pelos conselheiros. Um conselheiro oriundo de uma ONG local, por exemplo, se apresenta como representante de sua instituição, mas dificilmente como representante do setor das organizações não governamentais. Se o conselheiro não se identifica como um representante formal de um setor, dificilmente irá empenhar esforços para influenciar nas decisões tomadas com relação à UC, pois não reconhece a sua legitimidade frente a um determinado setor. Como conseqüência, o conselheiro se limita a defender os seus próprios interesses ou da sua instituição, deixando de lado uma visão mais abrangente do seu papel.

A falta de dimensão pelos conselheiros do seu potencial de influência esclarece, em grande medida, os freqüentes questionamentos sobre o caráter consultivo dos conselhos da UCs de proteção integral. Em várias oficinas, os conselheiros argumentaram firmemente qu e o conselho seria mais efetivo se tivesse um caráter deliberativo, sendo que alguns chegavam a reivindicar o papel deliberativo inclusive sobre o licenciamento ambiental, no entorno das UCs de proteção integral ou nas UCs de uso sustentável. De uma maneira geral, o papel consultivo não é entendido como uma possibilidade real de influenciar a tomada de decisão sobre a UC ou sobre o próprio setor.

Um dos princípios básicos da participação é a legitimidade, ou a qualidade e efetividade com que os membros do conselho exercem suas funções na defesa dos interesses dos seus segmentos, do conselho e da própria UC (TNC et al., 2004). Assim sendo, a dificuldade no entendimento desse princípio deve ser tratada em profundidade durante as capacitações de conselhos, pois impacta negativamente a atuação dos mesmos.

De uma maneira geral, o papel consultivo é compreendido como uma posição desprovida de poder e insignificante para o processo decisório. É necessário a internalização de que o papel consultivo deve ser desempenhado para ajudar o outro a perceber, entender e agir sobre fatos inter relacionados que ocorrem em seu ambiente. O poder inerente à posição consultiva é o de influência sobre o processo decisório, demandando principalmente competências interpessoais. A posição consultiva não exige especialidade em todos os conteúdos envolvidos no problema em questão, mas sobretudo no estabelecimento de um relacionamento que possa efetivamente ajudar o aconselhado (Edgar Schein,1972).

Outra característica observada na maioria das capacitações e que merece destaque foi o grau de representatividade dos conselhos trabalhados. Geralmente os conselhos eram bastante diversos, compostos pelos gestores das UCs, gestores municipais, políticos municipais, lideranças municipais e comunitárias, professores do ensino fundamental e universitários, polícia militar e ambiental, técnicos de órgãos de extensão rural, ambientalistas locais, comerciantes, proprietários rurais, quilombolas e assentados rurais. Essa diversidade contrasta com o observado há alguns anos, onde a maioria dos conselhos era composta por poucos setores e entidades (TNC et al., 2004). A diversidade de atores observada nas oficinas certamente representa um aumento na representatividade dos conselhos, mas por outro lado demanda um maior investimento na comunicação e na construção do diálogo entre diferentes pessoas com interesses muitas vezes antagônicos entre si.

A construção desse diálogo é um desafio a ser enfrentado durante as oficinas de capacitação, envolvendo em grande medida a capacidade de comunicação dos facilitadores do processo e habilidade na condução do grupo. Depende, sobretudo, de exemplos nas atitudes do próprio facilitador na moderação dos debates e dos possíveis conflitos. O facilitador deverá primar na postura cooperativa, assertiva, estabelecendo sempre uma relação “ganha- ganha” com e entre os participantes. A capacidade do facilitador moderar processos grupais é um fator crítico de sucesso para o êxito da capacitação.

Vários problemas levantados pelos conselheiros durante as oficinas, tais como dificuldade de comunicação e mobilização do conselho; falta de planejamento da UC; falta de objetividade nas ações voltadas para a UC e; falta de comunicação da UC com entorno, na realidade estão relacionados com aspectos gerenciais da própria UC que precisam ser trabalhados. De uma maneira geral, os responsáveis pelas UCs lidam com organizações complexas, muitas vezes carentes de recursos humanos e materiais e imersas em vários conflitos internos e externos. A realidade das UCs, principalmente as de uso sustentável, exige dos responsáveis uma visão sistêmica, competências e posturas gerenciais que resultem na melhoria do processo decisório, na comunicação eficaz e no gerenciamento de grupos. Em várias oficinas de capacitação percebemos uma preocupação com a formação técnica do gestor e pouco investimento na formação gerencial da equipe. Os responsáveis pelas UCs precisam estar preparados para mobilizar pessoas, coordenar grupos, ter visão do todo, planejar, gerar metas e acompanhar os projetos. Esses atributos dependem de uma comunicação clara e objetiva, capaz de atingir pessoas de diferentes escolaridades.

Usualmente o conselho é formado por pessoas oriundas das áreas rurais e urbanas, com diferentes níveis de escolaridade, habilidades e experiências. Buscando maximizar a participação de todos, principalmente daqueles com dificuldade de expressão em público ou não habituadas à participar de reuniões, fóruns e colegiados, é necessário destacar o caráter multidisciplinar do conselho e mostrar que sua riqueza consiste justamente na diversidade de pessoas envolvidas. Deve ser demonstrado que uma das funções dos conselheiros é justamente complementar o conhecimento que passará a ser coletivo, ou seja, que um conselheiro entende de ecologia, por exemplo, e o outro dos tramites da prefeitura ou da lógica da comunidade do entorno ou do turismo. Deve ser ressaltado que a gestão da UC é fortalecida com informações e posições oriundas de várias pessoas. As informações devem ser complementadas por todos para que o conselho consiga tomar decisões de qualidade, que de fato ajudem a UC a cumprir sua missão e a atender aos interesses dos setores envolvidos.

A dinâmica do ZIN se mostrou extremamente útil para demonstrar como informações parciais, provenientes de diferentes pessoas, se bem integradas, ajudam a solucionar um problema pré determinado. Simulando uma situação de tomada de decisão pelo conselho, a dinâmica coloca o desafio de se criar um ambiente de geração de informações válidas e uteis, que contribua na gestão da UC. O exercício ajuda a demonstrar que nem toda informação válida (corroborável) é útil para tomada de decisões de qualidade e que muitas vezes consideramos pressupostos e pontos de vista pessoais como informações, o que induz a decisões de baixa qualidade. Culturalmente estamos acostumados com reuniões exaustivas onde os participantes desfilam suas habilidades, proclamando sucessivas informações tecnicamente corretas, mas inúteis para o contexto, ou apresentando e insistindo em pontos de vista que se checados revelam-se como informações inválidas. Esse comportamento na maioria das vezes leva ao gasto desnecessário de energia, dispersão, distanciamento do foco e perda de tempo com o trato de falsos problemas. Para o fortalecimento do conselho é necessário tentar minimizar esse comportamento defensivo e maximizar os desempenhos pessoais e das partes interessadas. Deve ser enfatizada, ainda, a necessidade de aprender a falar oportunamente, a ser menos passional, escutar e analisar as informações geradas pelos outros, para validá-las e utilizá-las.

O conceito de comportamento produtivo em contraposição ao defensivo (Argyris, 2005) dá suporte à compreensão de como a interdependência entre comportamento e organização do trabalho é determinante para a capacidade de um grupo resolver problemas. A capacidade dos membros de um grupo de se organizarem, para gerar, integrar, validar coletivamente e utilizar informações num processo de solução de problemas, criará condições de escolhas de qualidade, além de favorecer o comprometimento com a solução encontrada, pois todos participam da construção do raciocínio. O apego a idéias pré concebidas, a determinação de ganhar do outro e manipular o grupo para obter vitória de seu próprio ponto vista, oblitera o processo de construção coletiva e fomenta o comportamento defensivo no grupo, gera disputas e conflitos.

Organização do trabalho e foco em resultados

Um dos aspectos comportamentais trabalhados durante a capacitação relaciona-se com o modelo de organização do conselho. Por ser um modelo novo, não vertical, onde não há relação hierárquica, e há uma distribuição equitativa do poder, a dinâmica do poder local pode sentir-se ameaçada, gerando ou acirrando os conflitos já existentes nas comunidades. Além disso, o fato de ser participativo pode representar uma grande dificuldade, pois culturalmente a sociedade brasileira ainda está aprendendo a trabalhar neste modelo. Os comportamentos necessários a participação produtiva contradizem uma tradição brasileira que tem suas origens no período colonial e com a qual precisamos romper. Durante as oficinas debatemos um pequeno trecho da obra do sociólogo e historiador Raymundo Faoro que se mostrou muito eficiente para tratar a questão. O tema tem um grande efeito sobre os participantes que identificam na sua experiência local os problemas abordados no texto.

“ Raymundo Faoro, em seu livro “Os Donos do Poder”, escreveu sobre a monarquia brasileira:Essa monarquia, acostumando o povo a servir, habituando-o à inércia de quem espera tudo de cima, obliterou o sentimento instintivo de liberdade, quebrou a energia das vontades, adormeceu a iniciativa. (…) Tudo é tarefa do governo, tutelando os indivíduos, eternamente menores, incapazes ou provocadores de catástrofes, se entregues a si mesmos”. Esta visão infantilizou as pessoas. Aliada a uma situação em que o que contava era ser “amigo do rei” e que fez da troca de favores um hábito natural na prática da política, gerou uma cultura de adesão e não uma cultura de deliberação. As pessoas se acostumaram a não analisar, não avaliar e não decidir suas posições, mas a aderir às posições de outros, normalmente dos que estão no poder” (Bernardo Toro, 1997).

Vários relatos dos participantes durante as oficinas faziam menção à pouca produtividade das reuniões dos conselhos e à frustração que isso causava. Como a maioria dos conselhos era recém criada, ou no primeiro mandato, os temas tratados se restringiam ao seu funcionamento, tais como regimento interno e transporte para participar das reuniões, ou eram relacionados com conflitos históricos, acirrando os ânimos sem chegar a nenhuma solução. Os depoimentos também indicavam que não existe um planejamento dos temas a serem abordados nas reuniões. Como não existe um fio condutor dos trabalhos, ou objetivos a serem perseguidos, as pautas das reuniões são definidas aleatoriamente, segundo os problemas que vão surgindo. Essa situação não difere muito com o observado há alguns anos, onde a maioria dos conselhos das UCs do país não estava tratando de assuntos de real interesse da sociedade, como planos de manejo, definição de zonas de amortecimento, estabelecimento de termos de compromisso com as comunidades locais, implantação de atividades econômicas e técnicas produtivas sustentáveis, visitação pública das UCs, etc (TNC et al., 2004).

A oficina de capacitação contribuiu muito para esclarecer o nosso papel como conselheiros e mostrar as possibilidades e dificuldades encontradas em trabalhos com grupos que pretendem atingir produtividade e que normalmente se perdem no processo sem alcançar os objetivos comuns ” (conselheiro da APA Serra da Mantiqueira).

Para alcançar os objetivos previstos nos Planos de Trabalho, os conselhos precisarão estabelecer um novo modelo de organização do trabalho. Apesar das oficinas tratarem dessa necessidade, essa organização não virá naturalmente, tendo em vista o grau inicial de implantação da maioria dos conselhos. Numa etapa inicial é necessário que os responsáveis pelas UCs atuem como facilitadores do processo, pois dificilmente os conselhos se fortalecerão sem o apoio e mobilização permanente por parte do gestor da UC e sua equipe. Além das dificuldades culturais com o modelo participativo, na maioria das UCs, a sociedade local não demandou a formação do conselho e não enxerga como esses fóruns podem contribuir para a proteção da UC ou para o desenvolvimento local.

Para romper essas limitações, numa etapa inicial dos trabalhos do conselho é importante que a mobilização dos conselheiros continue e que os mesmos sejam apoiados para executarem as atividades planejadas. Somente uma oficina de capacitação não garante que o conselho se manterá mobilizado com foco nos trabalhos a serem realizados. Na realidade, a capacitação é apenas uma parte de um longo processo de aprendizagem coletiva, que demanda um grande investimento por parte dos responsáveis pelas UCs. Entretanto, essa demanda pode se caracterizar num problema a ser enfrentado, pois muitas vezes o gestor da UC, além de não estar preparado para levar a cabo a empreitada, não conta com o apoio institucional para dialogar com a sociedade e comunidades locais.

Para que o conselho seja estimulado e não caia na frustração de ver “as coisas não avançarem”, é importante que alguns resultados sejam alcançados rapidamente. Mesmo os pequenos resultados devem ser destacados e contabilizados à performance do grupo. Ao optarem pela a oficina de capacitação e planejamento, os responsáveis pela UC devem ter em mente que a não execução o plano de trabalho produzido pelos conselheiros pode levar a um grande descrédito pelo órgão gestor, que em última instância foi o responsável por convidar a sociedade para participar da gestão da UC.

O processo de imersão

A proposta de imersão do grupo em três dias de trabalho, além de viabilizar o repasse dos conteúdos e a estratégia pedagógica da capacitação, gera benefícios ao processo de integração do grupo, que tem a oportunidade de conviver e estabelecer relacionamentos, fortalecendo assim os laços sociais. A capacitação tem como premissa que a performance do grupo é efeito da relação entre capacidade e conhecimento técnico dos membros e a qualidade da relação interpessoal que é estabelecida entre eles. O conteúdo, os resultados e as tarefas que um grupo é capaz de desenvolver são proporcionais ao grau de comportamento produtivo que é exibido por seus membros. A estratégia de imersão visa favorecer a construção de uma situação comportamental mais produtiva entre os membros do conselho. Assim sendo, não é recomendável que os participantes variem nos três dias de capacitação. Quando, por exemplo, um membro do conselho participa apenas do ultimo dia onde está sendo consolidado o plano de trabalho, sua atuação no grupo costuma ser inadequada ou passiva, pois atuará apenas na tarefa que está sendo desenvolvida, sem o preparo fornecido nos dias anteriores. A flutuação da participação cria condições adversas à estratégia pedagógica utilizada, que propõe componentes integrados e inseparáveis (conceitos, procedimentos e atitudes), para o alcance dos resultados previstos na capacitação.

Uma das maiores críticas feitas antes do início das oficinas, relacionada com a sua duração, não aparece nas avaliações realizadas no final das oficinas. Muito pelo contrário, alguns conselheiros chegam a explicitar que o tempo foi curto para o volume de informações e trabalho realizado. A maioria dos conselheiros destaca a oficina de capacitação como uma oportunidade única de intercâmbio e articulação entre os conselheiros. Alguns conselheiros também lamentam muito que nem todos os conselheiros participaram da oficina, salientando que o treinamento tinha sido muito importante tanto para o desenvolvimento pessoal, como para o fortalecimento do conselho, ressaltando que todos deveriam estar presentes.

Oportunidade de conhecer os conselheiros. Ter sensibilidade de ouvir e calar, este é o grande aprendizado. Trabalhar o consenso, este é o aprendizado grupal. Tem agora algo escrito que pode ser aplicado: metodologia – conhecimento – pode levar para as comunidades cultura do planejamento” (membro do conselho da APA Goiapaba-Açu, ES.)

Gostei muito da convivência de pessoas com idéia diferente...” (membro do conselho do Parque Estadual Serra das Araras e da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Veredas do Acari, MG).

 

Conclusão:

A opção de se adotar uma metodologia para capacitação dos conselhos de UCs centrada em três dimensões se mostrou muito eficaz. Em um tempo relativamente curto é possível iniciar um diálogo mais estruturado sobre vários problemas que fragilizam a UC e a gestão particpativa.

A oficina é um momento único para os conselheiros refletirem em mais profundidade sobre diferentes temas, que vão desde a conservação da biodiversidade à atuação política do conselheiro de UC. Várias oficinas de capacitação se constituíram na primeira oportunidade local de um debate mais estruturado e fundamentado sobre desafios para conservação e participação. Para muitos participantes, a oficina também é a primeira oportunidade de fazer parte de um exercício de planejamento participativo, incluindo a definição de prioridades e objetivos a serem alcançados.

Entretanto, para que a gestão participativa da UC através de seus conselhos ocorra em todo o seu potencial é necessária a continuidade nas ações. A participação exige a criação de espaços de diálogo, que por sua vez demandam a construção de relações de confiança entre os membros do conselho e o órgão responsável pela UC. Nem sempre isso é fácil de atingir. De uma maneira geral, os órgãos não estão preparados para conduzir um processo de longo prazo. Em algumas oficinas ficou evidente que o responsável pela gestão da UC desejava

repassar a responsabilidade operacional de mobilização do conselho imediatamente para os conselheiros. Nem sempre isso é possível. O fortalecimento do conselho demanda tempo e continuidade, sendo a capacitação apenas uma parte do caminho.

Iniciar o processo de mobilização, via o planejamento participativo do conselho, e não dar continuidade é um grande risco. Os responsáveis pela UC devem ter em mente que ao optarem pela metodologia apresentada devem se comprometer com a mobilização para execução do planejamento elaborado pelo grupo, seu monitoramento e aprendizagem decorrente. Caso contrário, a desmobilização e a improdutividade podem ser acentuadas. Os gerentes das UCs têm um papel fundamental na liderança da execução do Plano de Trabalho, que deve nortear as reuniões do conselho. Devem estimular o monitoramento do plano ao longo das reuniões, estimulando as reflexões sobre o desempenho do grupo e da UC e promovendo as alterações de rumo, favorecendo a aprendizagem e o amadurecimento do grupo. Esse papel mobilizador exige habilidade e treinamento dos gerentes, que precisam ter o perfil adequado para o diálogo e comprometimento do órgão gestor para continuar o processo.

Uma longa caminhada só se inicia quando queremos e damos o primeiro passo… e este nos fizemos. O resultado virá com a persistência e com o tempo”(conselheiro de UC do Corredor Ecológico da Mantiqueira).

A oficina mostrou claramente o que precisa ser trabalhado dentro do conselho. Foi interessante observar que o que julgávamos perfeito, ainda precisa sim de alguns ajustes” (gerente de UC do Corredor Ecológico da Mantiqueira).

 

Referências:

Argyris, C. 2005. Maus conselhos, uma armadilha gerencial: como distinguir conselhos eficazes daqueles que não tem valor. Editora Bockman. Porto Alegre.

Deming, W.E. 1990. Qualidade: A revolução da Administração. Editora Marques & Saraiva. Rio de Janeiro.

Faoro, Raymundo. Os donos do poder. Formação do Patronato Político Brasileiro. 1958. Editora Globo. Rio de Janeiro.

Herrmann, G. 2011. RPPN: o compromisso com a conservação da natureza em terras privadas. Ambiente Hoje, periódico mensal da Amda. Edição de julho/agosto de 2011. Belo Horizonte.

IBAMA. 2007. Gestão Participativa em Unidades de Conservação: Guia do Conselheiro. IBAMA / Núcleo de Educação Ambiental. Rio de Janeiro.

Palmieri, R. e Veríssimo, A. 2009. Conselhos de Unidades de Conservação: guia sobre sua criação e seu funcionamento. Imaflora / Imazon. Belém.

Schein, E. 1972. Consultoria de procedimentos e seu papel no desenvolvimento organizacional. Editora Edgar Blücher. São Paulo.

TNC, IEB, FUNBIO, WWF, IBAMA, Ministério do Meio Ambiente. 2004. Gestão Participativa do SNUC. Documento digital com os resultados da oficina sobre “Gestão Participativa do SNUC” realizada em 10 a 12 de agosto de 2004. Brasília.

Toro, J.B.A.1997.Mobilização Social: Um modo de Construir democracia e participação. UNICEF. Brasília.

 

Agradecimentos:

Agradecemos a todos os membros dos conselhos e os gestores das unidades de conservação que tivemos a oportunidade de trabalhar, cada uma das capacitações foi uma rica experiência que ajudou a consolidar a metodologia.

Agradecemos ao CEPF (Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos) e ao PDA – Subprograma Projetos Demonstrativos, parte do Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil, do Ministério do Meio Ambiente. O apoio dessas duas instituições para o projeto Corredor Ecológico da Mantiqueira viabilizou o desenvolvimento da metodologia.

Agradecemos ao Instituto Estadual de Florestas (IEF), de Minas Gerais, e ao Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (IEMA), do Espírito Santo, por tomarem a confiarem na metodologia e aplicá-las em suas UCs.

Agradecimento especial a Sônia Carlos, que participou da primeira oficina e a partir daí nos estimulou a continuar com o trabalho em outras UC. Valeu Sônia!

 
 

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